top of page

Em defesa de: Guilty Gear 2 -OVERTURE- — Análise | Crítica

Reprodução: Guilty Gear 2: - Overture -

O campo do “revisionismo gamer” é perigoso e só os que se acham corajosos o suficiente entram nele. Alguns trazem Final Fantasy XIII de volta, outros Dark Souls 2, audaciosos vão atrás de Devil May Cry 2 e outros se enganam com Assassin's Creed Odyssey. Mas nada disso é profundo de verdade no buraco, é coisa besta basicamente. Considerando isso, nada melhor do que o único disposto a citar coisa tipo Akudaikan e Azito no meio de uma conversa para virar o advogado de verdade dos jogos que merecem revisionismo, jogos esses que ninguém liga de fato e que só os dispostos a entrar na escuridão conseguem ver, ou seja os únicos merecedores de serem limpos na justiça. E para começar esse quadro, nada melhor que começar defendendo o clone de Dota exclusivo do Xbox 360 de Guilty Gear.


Além de Strive

Rock, anime, porradaria e Daisuke Ishiwatari

Como o título entrega, é bom explicar primeiramente o que é Guilty Gear de fato, considerando que boa parte do público que a série conseguiu vem apenas do Strive que mesmo sendo uma boa porta de entrada não é exatamente o que diria ser um bom exemplo do que é entrar dentro do projeto dos sonhos de Daisuke Ishiwatari, o criador, músico, desenhista, escritor, dublador e diretor de Guilty Gear que tinha a ideia na cabeça desde o ensino médio.


A série começou na Arc Co., que era uma empresa de suporte para portes de jogos de arcade que decidiu confiar a Ishiwatari o primeiro jogo original deles, Guilty Gear desde sempre é uma mistura de tudo que o seu criador curte rock de todo tipo, anime e jogo de luta, tentando ter o elenco mais variado possível em questões de referências. Guilty Gear conseguiu ter um sucesso com público variado que era a ideia de Ishiwatari, tanto quem curte anime de ação chuuni quanto quem curte jogo de luta. Na real, o primeiro Guilty Gear chegou a influenciar tanto o movimento kusoge dentro da comunidade de jogos de luta (quando o termo se envolve no estilo, é referente a jogos extremamente injustos e impossíveis de se jogar competitivamente mas com uma comunidade dedicada e que se dedica justamente por isso) quanto os anime fighters que são jogos com combate mais absurdos em questões de complexidade e efeitos ala Melty Blood.


Guilty Gear evoluiu um pouco do lado kusoge e foi se tornando um jogo menos quebrado (pelo menos fora da campanha, né I-no no XX Accent Core) e formou um público de fato fiel tanto no Japão quanto fora dele, apesar de ter demorado anos para ser um número grande. E era um que adorava tanto você ter no mesmo jogo um caçador de recompensas que vira uma arma biológica demoníaca que luta usando uma espada que parece mais uma pedra maneira, uma rounin que não tem um dos braços e olho e usa uma bandeira do Misfits, uma adolescente pirata que luta junto de um golfinho, um vampiro que pega sol anda com uma cruz em cada parte do corpo e leva sua esposa imortal para qualquer lugar, um médico de 3 metros com a cabeça coberta por um saco de papel que enfia o dedo na bunda dos outros como especial, uma dona de restaurante e um otaku ninja que virou presidente do próprio país em um futuro pós apocalíptico causado por uma guerra santa contra armas biológicas modificadas por um novo tipo de ciência, quanto adoravam o combate tão complexo que chegava a lembrar alguns comandos de Virtua Fighter. A Arc Co. se tornou a Arc System Works por causa da série, o risco de ter aceitado a ideia de um estudante e seu amigo rendeu demais e até hoje dá inúmeros frutos, só que houve um pequeno probleminha nisso que logo mais explico.


a acusação
Reprodução: Guilty Gear 2: - Overture -

Guilty Gear 2: - Overture - surgiu após 6 anos sem nenhum nenhum jogo da franquia que não fosse uma atualização do XX, com uma nova nomenclatura e um novo estilo de gameplay e sem quase nenhum personagem que existisse na série, sendo supostamente o jeito que Guilty Gear seria a partir de agora, com Ishiwatari e seu time criando interesse no novo fenômeno que estaria surgindo na europa e no resto do mundo depois do lançamento do mod Defense Of The Ancients (Dota, o mod de Warcraft 3 que basicamente deu origem aos mobas) e misturando com elementos vistos em Dynasty Warriors, Devil May Cry só que ainda mantendo aspectos dos jogos de luta como a lista de combos e certos momentos que o combate um contra um viraria basicamente Soul Calibur. E detalhe, ele não seria lançado para nenhuma plataforma que não fosse o Xbox 360 durante alguns anos. Como era de se esperar, Overture deu errado com os fãs que viram nele basicamente uma ofensa depois de tanto tempo sem nada, com a crítica que naquela época além da xenofobia extrema com jogos asiáticos não estava interessada em algo como Guilty Gear e com o público novo que ele queria alcançar que simplesmente não se encontrava no Xbox 360 e nem quando veio para a Steam deu uma salvada, foi até difícil achar material de crítica da época para ter uma base do que aconteceu.


Overture por muitos anos foi conhecido como o responsável por matar a série, virou a ovelha negra a ser esquecida e hoje em dia depois que a situação melhorou, por mais que ele seja o segundo jogo mais importante para Guilty Gear (mais por conta de como a lore afeta os personagens e o jeito que eles funcionam, exemplo pequeno legal é o Ky que no Strive adicionaram nele um outro especial por conta dos eventos do Xrd) é totalmente ignorado, como se não existisse. Eu mesmo quando comecei a comentar sobre Guilty Gear na internet depois de ter passado uns anos só no Xrd e no XX só descobri por conta de alguns amigos comentando depois de ter falado que queria algo justamente na vibe dele e hoje em dia o papel é invertido comigo falando disso para novatos. Overture foi maltratado por xenofobia, por um público que não ligava para ele e pelo público fiel que viu a existência dele como o maior dedo do meio, só que isso é bem injusto e mesmo hoje em dia as informações sobre o motivo da existência dele sejam públicas, não existem muitos interessados em tratar ele honestamente. 


A defesa

O pequeno probleminha que acabou quase destruindo Guilty Gear veio logo no começo, quando a Arc decidiu fazer o jogo acontecer ela era muito pequena e inexperiente para conseguir publicar um jogo sozinha e procurou parceria com empresas e achou a Sammy, que era focada em Pachinko e queria mover para jogos no geral e nível internacional, ela ajudou e após Guilty Gear ter dado certo ela ofereceu um contrato de publicar qualquer jogo da série, só que esse contrato também dava os direitos dos nomes, personagens, designs, músicas, cenários, etc. Qualquer coisa feita após o primeiro seria completamente deles e por anos isso não foi problema, até a Sammy se juntar com a SEGA. (o que não é algo problemático, a Arc até conseguiu trabalhar com Hokuto no Ken e criar um dos kusoges mais amados do cenário) que depois de uns anos decidiu cortar custos e como isso obviamente significa não cortar salário de empresário, eles decidiram não gastar mais nada em Guilty Gear e a única coisa permitida a se fazer eram versões novas do XX e spin-offs pequenos, o que acabou fazendo a série ficar anos sem nada que não seja o mesmo jogo e Isuka, que logo mais falo a fundo dele.


Como a Arc System Works não tinha os fundos necessários para comprar Guilty Gear de volta, ficou sem muitas opções, apesar que Ishiwatari e sua equipe ser apaixonada pela série. A solução surgiu justamente junto com Dota, onde os outros cenários de jogos competitivos surgindo acabou sendo usado de inspiração para um novo Guilty Gear que mantivesse o caráter único da série e competitivo aliados. E para evitar problemas com a Sammy, apenas Sol, Ky e That Man (o Asuka, para quem jogou só o Strive) estariam no jogo em questão de aparência e nome e todos os outros que fosse necessário seria chamado por um título poético aleatório com um design novo (enquanto que por questões de contrato, em toda entrevista eles falaram que era apenas questão de introduzir o resto com o tempo) e trouxeram vários personagens novos. E para representar aos fãs que esse poderia ser um novo começo para Guilty Gear, Ishiwatari quebrou a nomenclatura dos jogos que usava Xs para representar o número do jogo até aquele momento (X e XX). O 360 foi escolhido por ser mais fácil de desenvolver para um time pequeno e por ser também onde jogos competitivos estavam começando a criar terreno.


O time de Guilty Gear também aproveitou que eles já tinham testado um pouco os pés fora de jogo de luta com Isuka, um spin off que introduziu a A.B.A e que ao mesmo tempo que é um jogo de luta de times que lutam ao mesmo tempo em tela é um beat up que usa os comandos base de modo bem semelhante ao que Tekken faz em algum dos seus jogos que tem modos extras só que extremamente mais puxado para uma experiência de arcade (é um jogo bem maneiro para quem está afim de algo assim, recomendo bastante inclusive). Só que como sabem, não deu muito certo. 


O que pouca gente comenta é que o Overture acabou dando uma ajudada na Arc System a recuperar Guilty Gear. Com o tempo que se deu desde o XX original, ela ganhou experiência como publicadora e como parceira de várias outras desenvolvedoras, fazendo desde qualquer jogo de luta que a Bandai quisesse a virando basicamente a responsável por uma das séries de adventure mais importantes e influentes do cenário japonês Tantei Jinguuji Saburou/Jake Hunter e também Kunio Kun/River City que ajudou a fundar o gênero de beat up e segue firme e forte. E tem um detalhe, Mori Toshimichi, um amigo de Ishiwatari que trabalhava junto dele na Arc, acabou criando BlazBlue um jogo que tentaria seguir as mesmas ideias de Guilty Gear só que apelando totalmente para o público que foi criado pelos anime fighters que a série tinha ajudado a criar. Overture deu mais experiência ao time e juntando tudo isso, depois de alguns anos a Arc finalmente comprou tudo de volta e pode fazer o Xrd após mais uma máquina de pachinko. E isso deu tão certo que muitos nem fazem ideia que sequer teve uma época em que Guilty Gear não existia por conta de um inferno burocrático e considerando o sucesso de Strive, muitos nem consideram que vale a pena lembrar disso. Só que como sabem, estou aqui para defender o jogo abandonado na chuva chutado feio todo ferrado. Mas para começar de verdade, vou ter que fazer quem não conhece a loucura que é Guilty Gear ir a fundo de verdade.


Uma guerra santa, armas biológicas, uma cama robô, um cara que luta jogando sinuca e Axel Rose

Guilty Gear 2: - Overture - não é um jogo com comunidade online ativa então o que sobra nele a campanha e a campanha dele foi a primeira vez que Guilty Gear foi basicamente um anime de porrada interativo, então para aproveitar o jogo precisa manjar do mínimo da lore dos jogos. Vou deixar de recomendação o vídeo do The PCP no quadro onde um dos membros da basicamente uma aula universitária explicando sobre algum tema que eles gostam e que um deles demorou 4 horas para contar tudo sobre os jogos até o mais recente da época que era o Xrd. De qualquer modo, fica aqui o meu resumão do básico para entender os jogos.


Durante os anos 90 todas as tecnologias do mundo ao mesmo tempo decidiram dar problema e logo em seguida um tipo de vida tentou se manifestar e a sociedade ficou tão apavorada que decidiu banir e destruir todo tipo possível (apenas um país se recusou e se separou do resto da sociedade). Alguns anos se passaram, um grupo se manifestou e apresentou para a sociedade a magia, que seria a verdadeira ciência que mostraria de fato como o mundo funciona. A sociedade se reformou usando magia como nova ciência e isso acabou dando algumas habilidades de manipulações para as pessoas, tudo estava indo normal, só que nos fundos havia uma pesquisa sendo feita por um grupo de três pessoas: Frederick e Aria que eram um casal e Asuka. Eles estavam desenvolvendo as Gears que basicamente seriam as armas biológicas com base na magia que os Estados Unidos queriam usar, o problema é que Aria estava com uma doença terminal sem cura e queria morrer invés de ser congelada para ser curada no futuro enquanto Frederick e Asuka estavam dispostos a fazer qualquer coisa para salvá-la.


Não deu certo e no meio do processo Asuka transformou Frederick em uma gear e logo depois ele sumiu, deixando Asuka sozinho para terminar o processo que acabou resultando na Justice, a primeira gear perfeita usando Aria como base. Depois de uma fase de produção em massa de gears, os Estados Unidos preparado para declarar guerra aos outros países teve como surpresa a resistência da Justice que como primeiro ato decidiu destruir o Japão inteiro por conta de ter uma habilidade incomum de magia e ir atrás do resto da humanidade. E isso resultou em uma guerra de centenas de anos que foi chamada de Cruzadas por conta de como a sociedade se estabeleceu após esse evento (criando a ordem sagrada). Durante esse período de guerra, surgiu um homem que tinha a mesma capacidade de um japonês sem ser um que foi considerado o novo herói dessa sociedade e ajudou a selar Justice; ressurgiu Frederick, agora como Sol Badguy um caçador de gears e recompensas que largou a postura de cientista e ficou totalmente no seu lado mais agressivo e também surgiu Ky Kiske, um jovem guerreiro extremamente habilidoso que era respeitado por todos e rivalizava Sol. Alguns anos após o selamento de Justice, eventos acontecem que fazem a gear perfeita ser liberada e finalmente morta por Sol e resumindo de jeito rápido, Ky conseguiu arranjar uma namorada meio gear e Asuka surgiu do nada como o grande responsável por tudo de ruim que já aconteceu na história da humanidade junto de um grupo, a sociedade se reformulou ainda mais e muita coisa aconteceu com o elenco todo. Mas o que importa é que Ky ficou tão reconhecido que foi obrigado a virar o rei de um país novo depois de alguns anos como policial e Sol viveu sendo caçador de boa até que começou a ser acompanhado por um moleque chamado Sin. 


Overture começa apresentando esse último detalhe, só que com o bônus que as Gears restantes do mundo começaram a sumir e que o reino que Ky estava cuidando começou a ser atacado por um grupo que ninguém fazia a mínima ideia que existia usando um novo tipo de magia e Sol e Sin que estavam perto acabam se metendo na briga e não conseguiram fazer muita coisa até surgir Izuma, um ser que surgiu de uma outra realidade chamada de quintal que é onde basicamente tudo teve a sua origem e ele sabe exatamente como resolver a situação e ensina pro Sol como jogar um moba (existe toda uma explicação pra lore para as mecânicas em forma de tutorial). O trio agora vai atrás de Ky, descobre que um dos servos de Asuka o congelaram e que esse ataque está sendo comandado por Valentine, um ser que ninguém faz muita ideia do que seja e agora eles precisam achar um jeito de resolver a situação. Agora vocês tem o contexto base para entender a campanha, então vamos mais a fundo nela e no jogo de fato.


League of Legends se fosse bom

Overture segue todo o molde que você espera de um moba, personagens com estilos únicos para criar uma situação de times interessantes em um cenário grande com vários alvos e minions que podem desde ajudar a atrapalhar e são fundamentais. O que me chama atenção é como ele faz isso e depois de você pegar jeito do jogo, entende por que ele abre com um tutorial até que um pouco exaustivo. Os minions são comprados pelos jogadores, existe todo um sistema de pedra, papel e tesoura que precisa ser considerado e também é preciso direcioná-los, cada um tem um design completamente diferente dependendo do personagem que está jogando apesar do balanceamento entre eles se manter. Você também pode construir melhor seu boneco do jeito que quer com algumas habilidades especiais compráveis durante a partida que tem até estágios diferentes, por exemplo, o Sol pode ativar o seu dragon install (basicamente o devil trigger do Dante de Devil May Cry) no começo da partida como uma melhoria de atributos básicos e conforme vai acumulando mais pontos ou chegando próximo do fim da partida pode ficar na forma completa e liberar basicamente um personagem novo.


E também dá para usar alguns itens que ajudam ou atrapalham que são compartilhados entre todos os personagens, é a dinâmica básica de um moba só que com um toque mais direto e que chega a lembrar mais Dynasty Warriors, principalmente por uma escolha do combate que não vi muita coisa parecida até hoje. Contra grupos grandes, se o jogador quiser, ele pode esmagar botão sem mirar em ninguém e terá golpes em área, com a opção de até atacar e criar uma distância se estiver cercado e acertar o comando no momento certo, o jogo basicamente vira um musou. Só que se decidir mirar, de repente essa simplicidade some e fica tudo muito mais mecânico, puxando mais para o primeiro Devil May Cry e a aproximação inteira muda, mesmo que boa parte dos comandos simples se mantenham. E se outro personagem entrar em combate, o jogo basicamente vira Soul Calibur com os comandos que você normalmente usaria em Guilty Gear


É algo caótico, complicado de se pensar rápido e que para quem não conhece Guilty Gear mecanicamente falando, talvez nem faça muita diferença quando se trata de combates mais diretos. É um dos motivos por que muita gente não curtiu o jogo no lançamento mas quem gostou se manteve bem grudado nele por certo tempo (pelo menos segundo os relatos da internet). A falta de personagens para algo que deveria ser focado no multiplayer machuca bastante, mas se considerarmos só a campanha não vejo o que reclamar. E como disse antes, é algo que Isuka acabou fazendo antes, nele você joga Mortal Kombat Mythologies: Sub Zero se fosse japonês praticamente. Existia certo interesse de se misturar estilos sem perder o lado jogo de luta e Overture consegue capturar isso muito bem, ainda mais nos momentos em que o combate um contra um acontece e você consegue fazer algum combos do Sol ou do Ky que tem nos jogos sem problemas.


No fim das contas, Overture acabou sendo um dos jogos mais únicos do Xbox 360 que joguei (e olha que eu fui a criança esquisita que ia atrás de coisa tipo Ninja Gaiden 2 e Deadly Premonition invés de Halo 3), a arte do Ishiwatari sendo adaptada perfeitamente com esse estilo misto cria algo que quando clica, ele só clica bem demais e te lembra que o que você está jogando é Guilty Gear, algo que o Isuka e o Strive não conseguem com tanta frequência mesmo sendo bem mais próximos por exemplo. Dá para entender que na época essa proposta era difícil demais de vender e entender mas hoje em dia ver como tratam ele com piada sem dar nenhuma chance só por ser um alvo fácil é bem decepcionante por causa que atualmente o que mais espero é a Arc tomar coragem de tentar algo assim de novo. Mesmo que o Overture só tenha 3 pessoas atualmente jogando na Steam (e eu sou uma delas), é algo que recomendo muito pelo quão divertido é de jogar e parte disso é da campanha que é excelente, ainda mais como primeira tentativa de filme de anime jogável. 


Reprodução: Guilty Gear 2: - Overture -

E filme de anime jogável não é exagero, Overture na sua campanha se apresenta de jeito mais cinematográfico e se estrutura inicialmente de modo simples para isso funcionar. Temos a cena contextualizando o motivo para a porradaria existir, a porrada e segue para próxima. Pelas duas primeiras fases pelo menos, a terceira encerra já mostrando como o jogo vai abusar de tentar ser criativo com as suas mecânicas e obriga você a jogar uma fase de Sonic Unleashed com o Sin. Overture não tenta ser um filme de anime jogável no sentido que você joga quando acontece confronto, ele tenta te colocar para fazer parte de toda ação que não seja conversa e isso acaba fazendo ele manter a criatividade na duração toda. E vamos a alguns exemplos disso: depois do trio ter encontrado Ky congelado e Sol ter decido o cacete em Raven (o servo de Asuka) eles decidem ir para onde Izuma mora que supostamente teria a solução, o problema é que Valentine tinha passado por lá e conseguiu controlar a mente de todo mundo que habitava o terreno e invés de sair matando os futuros aliados, Sol precisa achar uma saída sem entrar em confronto e fazemos isso com ele em um cenário que lembra fim de partida de moba com a quantidade de minions por metro quadrado.


Logo depois disso Izuma revela que existe uma sociedade secreta de Gears onde todas que não são violentas se isolaram por medo de criar confronto com humanos e ficam tranquilas lá e o líder delas pode ajudar facilmente a soltar Ky, só que Sol arranja briga por ficar chamando ele de pássaro apesar da aparência de dragão e isso resulta em uma partida de League of Legends que têm um desafio até que bacana. Não tem fase parecida com a outra em sequência e o ritmo da história e o que rola na parte de ação é muito bem pensado, o tipo de coisa que incentiva terminar de uma vez de tanta eficácia. O problema é que existe a fase 8, logo depois de Sol e o doutor Paradigm (o lider das gears) ser resolvida e eles descobrirem mais a fundo sobre o que está acontecendo, Valentine ataca. Ela está tentando entrar no quintal, não se sabe o objetivo mas por algum motivo as gears estão envolvidas e se Sol e Paradigm não forem rápidos uma cidade inteira vai ser dizimada.


Contexto bem maneiro, né? É a primeira vez que o jogo aplica o conceito de uma partida normal com o número que se teria de jogadores e o cenario que você tem para se planejar é bacana, Paradigm está na ponta mais próxima de onde o ataque de Valentine vai surgir e você pode flanquear a guerra rolando e ir direto para ela. Ele tem uma certa vantagem de não precisar ir direto, minha ideia então quando iniciei a fase foi justamente deixar ele enviando as tropas dele para a briga e me preocupar com o ataque direto. O pequeno problema é que Paradigm mesmo sendo um personagem mais dedicado ao gerenciamento de tropas, vai direto para o ataque na área inimiga junto do seu exército, e o que acontece quando você tá nessa sem dominar o terreno? O oponente fica mais forte e em pouquíssimo tempo Paradigm morre e automaticamente perde. E independente do que você faça, o passarinho maldito vai para lá e teve vezes que faltando pouquissimo para vencer ele morria por birra. Claro, tem soluções como a de um ponto de S.T.A.L.K.E.R: Clear Sky que o jeito mais fácil de passar por um problema quase idêntico (no caso é que tem um soldado a 20 km de distância com uma metralhadora disposto a te fuzilar se você pisar mais um cm perto dele) que é correr e rezar pelo rng te deixar chegar no objetivo, mas acaba sendo bem difícil. É uma ideia legal mal executada que fica cansativa invés de desafiadora e me fez entender como o jogo deu errado fora do online por causa que é bem compreensível largar só por achar que não vale a pena o esforço. Minha solução foi ver um macete no youtube que funciona e para minha surpresa, o jogo depois disso não tem mais nada de negativo.


Depois disso, Overture mostra que ele consegue ter uma fase dedicada para cada influência que o jogo teve e manter um interesse na história e o conflito dos personagens como uma constância. Ky é liberado e é explicado que Valentine está atrás de todas as Gears por causa que a namorada do rei, Dizzy, é a chave necessária para se chegar no quintal por conta dela ser do mesmo molde que Justice e o desaparecimento das Gears vem por algo que está acontecendo lá. É também revelado que Sin é o filho de Ky e Dizzy e que foi deixado com Sol para evitar ataques da ordem sagrada e nesse momento Overture vira um episódio de Casos de Família com direito ao Sin saindo e entrando em uma fase de hack and slash com várias ordas surgindo em um cenário gótico com chuva de noite e é irado, um desafio bom com um personagem bem pensado para o momento e que realmente te vende a ideia da campanha ser um filme de anime interativo. Só que o jogo continua entregando, Sin por ser filho de Dizzy consegue ser usado como chave e é sequestrado, Valentine manda um ataque total no reino usando as gears da sociedade secreta e seu exército e Ky junto de Paradigm depois de um debate sobre superar os erros da história se unem com orgulho e fazem uma defesa sem matar nenhuma gear inocente num momento que o jogo vira um tower defense só que sem poder atacar um tipo específico de inimigo (apesar que parte da ideia da fase é você paralisar eles e usar uma magia que faz eles voltarem ao normal).


E na reta final do jogo só temos fases que mudam completamente a dinâmica, uma Sol precisa explorar um cenário inteiro usando dicas para achar algo que vai ajudar a resolver tudo, em outra jogamos com Izuma pela primeira vez e fica mais parecendo o Overlord da Triumph Studios do que qualquer outra coisa, uma partida do Xrd e quando fica prestes a encerrar temos Ky e Sin se juntando, resolvendo os problemas de pai e filho e colocando o jogador para brincar em Dynasty Warriors com gerenciamento do seu exército inteiro. 


Depois disso, chegamos onde seria a entrada para o quintal e Asuka aparece na frente de Sol e o resto, avisando a eles que nenhum ser normal conseguiria aguentar o quintal e que Valentine já estava lá e que ele queria ajudar Sol a ir. Só que Frederick tem motivos de sobra para querer Asuka morto, ele libera todo seu poder e parte para cima e o jogo faz a luta ser um bullet hell, isso em 2008 antes de NieR de Yoko Taro popularizar a ideia em 2010 e quando cheguei nessa parte pela primeira vez, fiquei maluco. O tema era excelente, a cena foi construída de jeito perfeito, usaram as linguagens próprias de video game para fazer algo interessante e POR ALGUM MOTIVO falaram que esse jogo era ruim por ser criativo. Dá para entender a revolta dos fãs com o contexto da época, mas hoje em dia e o da crítica no tempo? Não. O crime de Overture foi ser único e único no jeito que Guilty Gear é Guilty Gear. O primeiro confronto jogável entre Sol e Asuka acontece em um sistema de bullet hell por causa que Sol ainda não tinha nem como machucar o homem que destruiu sua vida e fez ele matar a mulher que ele ama pelo menos quatro vezes beirando a quinta considerando que Valentine é feita com a aparência de Aria. Se não bastasse isso ser algo de tirar o chapéu, a fase em seguida Valentine vira Justice e eles não só recriam a animação dela do jogo original como a luta, só que dessa vez com Sin ajudando a ganhar.


E a luta final é feita do jeito mais chuuni possível, com Sol mandando todo mundo fugir enquanto o portal do quintal se fechava por causa que ele iria acabar com Valentine de uma vez por todas e ela se transforma num mecha gigante no meio de um rio vermelho enquanto Sol corre para destrui-la. E adivinha? Mesmo eles tendo escolhido o pior modelo possível para uma luta final, eles conseguiram fazer algo que deixasse único e mais impactante com Sol entrando dentro dela e vendo milhares de Valentine e conversas da Aria, com a luta só acabando quando Sol mata sua amada pela quinta vez. Nesse momento eu me rendi, Daisuke Ishiwatari e todo o time por trás de Guilty Gear são uma das melhores equipes ativas que temos trabalhando em jogos hoje em dia e Overture é inocente.


Tudo em Guilty Gear é criativo e vindo de uma honestidade autoral admirável, o dublador do Sol até o Overture era O PRÓPRIO Ishiwatari que via ele como o exemplo de pessoa que queria ser; quase tudo que tem um nome em Guilty Gear pode ser ligado diretamente a uma música que tem influência visível no produto final; o carinho na história e que cada personagem recebe para ser a coisa mais legal do mundo e como a Arc System tem um senso de ação tão bom. É de surpreender e Overture mesmo tendo sido feito no ponto mais baixo que a série teve, ele conseguiu manter essa tocha ativa com orgulho. Guilty Gear é algo muito absurdo até hoje para a crítica tradicional dar o respeito que a série merece, nem parte do público tem vontade de dar essa valorização.


Mas se você se interessa em jogos por ser uma forma de arte criativa com natureza interativa, não tem como não reconhecer Guilty Gear ou pelo menos o Ishiwatari que é um ótimo representante para o que milhares de desenvolvedores indies fazem de colocar toda a sua paixão nos seus projetos e fazer parte de cada parte possível do desenvolvimento. Dá para aproveitar a franquia pelo trabalho incrível do time de animação, seja na era 2D ou 3D, pelo quão dedicados eles são ao lado musical, pelo quão bom eles são como jogos de luta e por aí vai. Mas não dar o mesmo tratamento para Overture que consegue trazer isso para uma mistura de estilos diferente é sacanagem.


Vai sempre existir uma repulsa à exploração de sensos artísticos diferentes do convencional e é bem decepcionante ver que não é algo que diminui. Seja nos jogos com desenvolvedores não conseguindo ter seus projetos aprovados por não seguirem o modelo que supostamente vai dar mais dinheiro e atrair produtores ou na indústria de quadrinhos latino americanas não querendo reconhecer ninguém que não tenha algum nome num evento que o foco é justamente esse. Essa repulsa por tudo que não seja tradicional e atraia dinheiro é uma merda, ainda mais quando reflete no público. E como isso liga com o que foi dito antes? Overture é só um exemplo de como tem muita coisa que só foi destruída por tentar ser diferente. Minha ideia com esse projeto não é causar um efeito de revisionismo, afinal a maioria não vai ter nem público suficiente para ser considerado sequer odiado. É mostrar sempre que tiver afim algum jogo que eu curto que foi condenado e esquecido por puro azar, em resumo é ser o Saul Goodman dos games estranhos.


Texto editado e revisado por Maya Souza (@ShinMayanese).


Fontes:



E que tal entrar no nosso grupo do Discord? Lá temos vários eventos, materiais de estudo e uma comunidade incrível esperando por você. É só clicar aqui!


Siga o Game Design Hub nas redes sociais!


64 visualizações0 comentário

Comments


bottom of page